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O que é anedonia em idosos?

Quando envelhecemos, nosso corpo muda, assim como a mente, o círculo social e a forma como lidamos com o mundo. Essas transformações podem ter efeitos positivos e negativos: pessoas mais velhas podem se tornar mais sensíveis ou, ao contrário, desenvolver menor sensibilidade aos eventos estressantes. Podem se tornar mais seletivas e buscar vínculos fortalecidos e duradouros com sua rede de apoio, ou podem simplesmente se isolar de todas as pessoas que conhecem. Algumas desenvolvem uma inteligência emocional mais madura, outras manifestam uma forma mais depressiva de encarar a vida. Tudo depende do contexto sócio-histórico, das condições do ambiente em que vivem, das experiências acumuladas — entre muitos outros aspectos que vão muito além da fisiologia humana.

Hoje, vamos apresentar o conceito de anedonia e o que ele representa. Nosso objetivo é contribuir para uma compreensão mais profunda dos fenômenos vividos durante o envelhecimento, especialmente ao oferecer conhecimento sobre sinais de alerta, possíveis causas e formas de lidar com esse cenário.

O conceito de anedonia

De acordo com o Oxford English Dictionary¹ e estudos acadêmicos da Universidade de Oxford, anedonia é definida como a perda de interesse ou incapacidade de sentir prazer em atividades que antes eram prazerosas, abrangendo tanto a dimensão da motivação quanto do prazer imediato e da aprendizagem associada a recompensas.

Os pesquisadores de Oxford descrevem três componentes principais do fenômeno:

  1. Antecipatória: dificuldade em antecipar prazer (“não se sente motivado a esperar bons momentos”).
  2. Consumativa: incapacidade de alcançar prazer no momento (“não sente prazer durante a atividade”).
  3. Motivacional e de aprendizagem: redução na capacidade de agir para buscar recompensas e aprender com elas.

Estudos de Harvard e McLean Hospital mostram que, em pessoas com anedonia, há respostas reduzidas nas áreas ligadas ao sistema de recompensas, como o estriado ventral, córtex pré-frontal medial e córtex cingulado anterior. Por exemplo, em exames de neuroimagem, indivíduos com anedonia apresentam:

  • Redução da ativação do núcleo accumbens e do córtex cingulado anterior durante tarefas de recompensa.
  • Alterações na conectividade neural que influenciam a aprendizagem relacionada a recompensas.

Alguns estudos longitudinais do grupo de Harvard indicam que menores respostas do sistema de recompensa preveem piora significativa da anedonia e declínio funcional, o que destaca a importância de diagnosticar e intervir precocemente.

¹ Fonte: https://ora.ox.ac.uk/objects/uuid%3Aef19881d-2be8-4642-ac80-26a535752d33/files/rcf95jc37x?utm_source=chatgpt.com

De onde surge a anedonia?

Nenhum sentimento surge do nada. Por trás da apatia, da falta de entusiasmo ou do afastamento do mundo, quase sempre existe uma história que precisa ser escutada com mais cuidado. A anedonia, nesse sentido, não é apenas uma ausência de prazer — ela é também uma presença silenciosa de algo que adoece, esvazia ou paralisa a capacidade de sentir.

As causas da anedonia são múltiplas e complexas. Envolvem corpo, mente, ambiente e tempo vivido. E, quando falamos de pessoas idosas, precisamos considerar ainda os atravessamentos do envelhecer: perdas, rupturas, invisibilidades e transformações que se acumulam de forma muitas vezes solitária.

Entre as principais causas reconhecidas pela literatura científica, podemos destacar:

  • Transtornos do humor, especialmente a depressão: A depressão é a causa mais frequentemente associada à anedonia, e muitas vezes o primeiro sintoma percebido não é a tristeza, mas sim a perda de prazer. Em idosos, isso pode ser confundido com “cansaço da idade”, quando na verdade é um sinal claro de sofrimento emocional.
  • Uso de medicamentos: Alguns medicamentos, como certos antidepressivos (especialmente os inibidores seletivos de recaptação de serotonina), antipsicóticos e ansiolíticos, podem interferir na resposta emocional do cérebro, reduzindo a motivação e o prazer. A chamada “apatia medicamentosa” pode ser sutil e, muitas vezes, passa despercebida nos atendimentos.
  • Doenças neurológicas e neurodegenerativas: Condições como Alzheimer, Parkinson e outros tipos de demência também estão associadas à anedonia. Nesses casos, o comprometimento das funções cognitivas pode afetar diretamente a percepção de prazer, o desejo de socialização e a capacidade de iniciar atividades espontaneamente.
  • Isolamento social e solidão: A ausência de conexões significativas, de convivência, de escuta e de afeto tem um impacto profundo na saúde mental de qualquer pessoa — e ainda mais na de alguém que envelhece. O isolamento pode não apenas reduzir as oportunidades de experiências prazerosas, mas também enfraquecer o próprio desejo por elas.
  • Experiências de vida adversas e contexto: Histórico de traumas, vivências de exclusão, pobreza, violência, discriminação e perda de sentido podem contribuir significativamente para o desenvolvimento da anedonia. O corpo envelhece com as marcas de uma vida inteira: marcas que muitas vezes não são visíveis, mas que continuam operando silenciosamente dentro da pessoa.

A anedonia, portanto, não é um “desinteresse sem motivo”. É um sintoma que carrega histórias, dores e atravessamentos. Entendê-la exige escuta, sensibilidade e uma postura ética diante da complexidade do envelhecer.

Sinais de alerta: quando o prazer já não se encontra presente

Identificar a anedonia em pessoas idosas nem sempre é fácil. Muitas vezes, ela se disfarça em frases como “não tenho mais vontade”, “pra mim já deu”, “nada mais me anima”. É comum que familiares e até profissionais interpretem isso como desinteresse natural da idade, quando, na verdade, pode ser um pedido de ajuda silencioso.

Estar atento a pequenas mudanças de comportamento pode fazer toda a diferença. Alguns sinais que merecem atenção:

  • Afastamento de atividades que antes eram apreciadas, como ouvir música, caminhar ou conversar com vizinhos.
  • Falta de entusiasmo mesmo diante de novidades ou propostas agradáveis.
  • Redução da iniciativa: a pessoa deixa de buscar por si mesma as atividades cotidianas.
  • Relatos recorrentes de vazio, indiferença, apatia ou “falta de sentido”.
  • Queda de energia sem explicação física.
  • Negligência com o autocuidado: higiene, alimentação, medicação.

A anedonia nem sempre aparece sozinha. Ela costuma vir acompanhada de outros sinais emocionais, como irritabilidade, tristeza profunda, crises de choro ou, ao contrário, um silêncio denso que se instala. É importante compreender que isso não é frescura, não é preguiça, não é velhice “difícil”: é sofrimento.

Formas de lidar com a anedonia e oferecer suporte a quem precisa

A anedonia é, sim, um fenômeno difícil e pode parecer difícil de transpassar, mas devemos lembrar que essa condição não é definitiva. Há caminhos possíveis, e eles passam pelo reconhecimento do sintoma, pela oferta de apoio qualificado e por pequenas intervenções que devolvam à pessoa idosa o direito ao prazer, ao desejo e ao encontro.

Buscar avaliação profissional: O primeiro passo é não ignorar os sinais. Um profissional da saúde mental (psicólogo, psiquiatra ou geriatra com olhar ampliado) pode avaliar o quadro, identificar possíveis causas subjacentes e sugerir o tratamento mais adequado, que pode incluir psicoterapia, intervenções psicossociais e, em alguns casos, uso de medicação.

Trabalhar o prazer como parte do cuidado: Recuperar o interesse não é forçar a pessoa a “se animar”, mas criar condições reais para que ela reencontre o gosto pelas coisas. Atividades pequenas, mas significativas — como jardinagem, arte, culinária afetiva, música, lembranças boas — podem reativar caminhos internos de prazer.

Reforçar vínculos e convivência: O prazer é um fenômeno relacional. Muitas vezes, o que falta não é estímulo externo, mas conexão humana. Por isso, investir em momentos de qualidade, escuta atenta, visitas, convites simples e vínculos consistentes pode ser mais eficaz do que qualquer fórmula mágica.

Respeitar o tempo e a singularidade: Cada pessoa tem seu ritmo. Há quem precise de espaço antes de abrir o sorriso de novo. O mais importante é não desistir dela, mesmo quando ela parece ter desistido de si. A constância da presença é um antídoto poderoso contra o esvaziamento afetivo.

A anedonia nos obriga a pensar o cuidado para além das queixas físicas. Ela nos convida a olhar para dentro — da pessoa e de nós. Porque, no fim, cuidar de alguém que perdeu o prazer é lembrar a ela, com gestos e palavras, que a vida ainda pode ser boa. E que há sempre um caminho de volta.

Cuidar de alguém com anedonia não é apenas tentar “animar” — é sustentar presença, escutar com paciência, lembrar que ainda existe beleza, mesmo quando ela parece esquecida. É reensinar a pessoa a saborear uma fruta, cantar uma música antiga, mexer na terra, sorrir sem culpa.

No Terça da Serra Residencial Sênior, acreditamos que viver bem vai muito além de manter a saúde física — é também reencontrar o prazer de estar, de conviver, de sentir. Nossa equipe especializada trabalha todos os dias para oferecer um ambiente acolhedor, seguro e cheio de significado para cada pessoa idosa que chega até nós.

Se você conhece alguém que anda desanimado, isolado ou sem vontade de participar da vida, convide-o a conhecer uma das nossas unidades mais próximas de você!