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Entenda o conceito de gerontologia social crítica

A área de estudos do envelhecimento tem diversos ramos, em que o estudo sobre o envelhecimento como um processo coletivo e social, permeado não apenas pelo passar dos anos, mas também pelo passar das pessoas em nossas vidas, pelo passar dos momentos, das memórias, do ambiente que nós vivemos. A gerontologia social crítica é mais específica, ela apresenta uma análise aprofundada do impacto que a convivência social e o avanço histórico, antropológico e ambiental têm na nossa vida.

Não se trata apenas de como nós queremos envelhecer, mas também sobre quem tem o direito de envelhecer, quem tem acesso às políticas públicas e aos direitos fundamentais previstos na constituição federal para poder envelhecer com saúde e de forma bem-sucedida. Entenda melhor sobre esse conceito aqui no blog!

Entenda o conceito de Gerontologia Social Crítica

Envelhecer não é só um acúmulo de anos. É um acúmulo de experiências, de perdas, de resistências, de memórias que se entrelaçam com o tecido coletivo da vida. Cada ruga carrega um tempo que passou, mas também um tempo que foi negado. Cada corpo envelhecido fala de uma biografia, mas também de uma sociedade.

A gerontologia social crítica surge como uma lente que amplia o olhar. Ela não quer apenas entender o envelhecimento como um processo natural e linear, mas sim como um fenômeno profundamente social, político e desigual. Enquanto outras abordagens se preocupam com a adaptação da pessoa idosa ao mundo que envelhece, a gerontologia crítica se pergunta: que mundo é esse? E por que ele não se transforma para acolher todas as velhices?

Ao contrário do discurso dominante — que muitas vezes responsabiliza o indivíduo por “envelhecer bem” —, a gerontologia social crítica devolve ao coletivo a responsabilidade de garantir condições justas e dignas de envelhecimento. Ela provoca, tensiona e denuncia. Questiona os efeitos do capitalismo sobre os corpos que já não produzem, os silenciamentos vividos por mulheres idosas, as ausências nas políticas públicas, o abandono mascarado de autonomia.

Não se trata apenas de como envelhecer, mas quem pode envelhecer.
Porque em um país onde o racismo, o sexismo, a lgbtfobia, a pobreza e o capacitismo atravessam o ciclo da vida inteira, envelhecer com dignidade ainda é um privilégio de poucos.

A gerontologia crítica nos convida a parar de falar sobre envelhecimento como se fosse uma escolha pessoal. Não é. É um projeto coletivo — e, muitas vezes, um projeto falho. Essa abordagem nos ajuda a perceber que há velhices negadas antes mesmo que elas possam acontecer. E nos convoca, como profissionais e como sociedade, a pensar: que futuro estamos permitindo viver?

Quem tem o direito de envelhecer?

Costumamos falar sobre o “direito ao envelhecimento” como se fosse algo garantido, universal. Mas quando olhamos com mais cuidado, percebemos que essa promessa não alcança a todos — e que o direito de envelhecer, na prática, ainda é uma conquista profundamente marcada por classe, raça, território, gênero e corpo.

Quem são as pessoas que morrem cedo, que adoecem antes, que não conseguem chegar aos 60? Quem são aquelas que chegam, mas chegam exaustas, isoladas, invisíveis, sem acesso à rede mínima de proteção? Envelhecer é um privilégio negado a muitos. Se o Estado falha em garantir direitos fundamentais desde o nascimento — saúde, moradia, educação, trabalho digno —, então a velhice se torna apenas o acúmulo de todas essas ausências.

No Brasil, mulheres pretas da periferia têm expectativa de vida até 20 anos menor do que homens brancos de classe alta. Pessoas trans enfrentam uma expectativa de vida de cerca de 35 anos, o que sequer lhes permite o direito de serem consideradas idosas. Pessoas com deficiência enfrentam uma exclusão silenciosa, com suas necessidades ignoradas por políticas públicas que seguem pensando a velhice dentro de um ideal de autonomia padronizada.

Essa realidade nos obriga a refazer a pergunta: envelhecer como? onde? com quem? com quais recursos? E mais: quem é responsabilizado quando esse envelhecimento não acontece? A gerontologia social crítica se coloca justamente nesse ponto de ruptura. Ela rompe com o discurso meritocrático do “envelhecer bem”, que diz que basta querer, planejar e cuidar da saúde. Porque ninguém envelhece apenas por esforço próprio.

É preciso que as condições estejam dadas. Que o território seja seguro. Que haja um SUS forte. Que o SUAS não esteja sucateado. Que o idoso não precise escolher entre o aluguel e o remédio. Que o cuidado não recaia exclusivamente sobre mulheres sobrecarregadas. Envelhecer é um direito humano. Mas, do jeito que a sociedade está organizada hoje, esse direito ainda está longe de ser plenamente garantido. E é por isso que precisamos continuar perguntando: quem está ficando para trás enquanto alguns falam sobre longevidade como se fosse um prêmio?

Envelhecimento, invisibilidade social e a promessa não cumprida das políticas públicas

O envelhecimento, quando olhado com pressa ou apenas por gráficos demográficos, parece um dado técnico: o país está envelhecendo, é preciso se preparar, investir em previdência, repensar o mercado de trabalho. Mas quando olhamos com olhos atentos, o que aparece é outra coisa: um processo socialmente desigual e sistematicamente invisibilizado.

Pessoas idosas somem dos centros urbanos, dos debates políticos, da publicidade, da cultura. E quando aparecem, muitas vezes é em lugares marcados pelo assistencialismo, pela caricatura ou pela comiseração. O idoso como “velhinho”, dependente, infantilizado. Ou, ao contrário, como “exemplo” de superação, ativo, produtivo. Ambos os extremos desumanizam.

A velhice comum — real, diversa, contraditória — segue sendo apagada. Essa invisibilidade é ainda mais brutal quando atravessada por outros marcadores: o idoso pobre que vive nas franjas do território, a mulher idosa que cuida de todos, mas não é cuidada, o corpo preto envelhecido que carrega não só o tempo, mas também as marcas do racismo estrutural. E o silêncio em torno dessas realidades não é acidental. Ele é parte de um projeto político que prefere não enxergar o que exige transformação profunda.

Nesse cenário, as políticas públicas — que deveriam garantir o direito de envelhecer com dignidade — tornam-se promessas não cumpridas. A Constituição Federal de 1988 reconhece a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado. Também afirma que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à pessoa idosa o direito à vida, à saúde, à alimentação, à cultura, à cidadania. Mas entre o papel e a prática, há um abismo.

O Sistema Único de Saúde (SUS) e o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) são pilares fundamentais para o cuidado e proteção de pessoas idosas — especialmente das que estão em maior vulnerabilidade. Mas o que vemos, na realidade cotidiana, são CRAS sucateados, equipes reduzidas, ILPIs improvisadas, profissionais adoecidos e famílias sobrecarregadas. E tudo isso acontece ao mesmo tempo em que cresce um discurso moralizante, que responsabiliza o próprio idoso por sua condição. Como se bastasse “se cuidar”, “manter a mente ativa”, “ter projetos de vida”.

Mas como manter projetos quando se está com fome? Como pensar em bem-estar se a aposentadoria mal cobre o aluguel? Como se manter ativo num corpo atravessado por doenças negligenciadas? O envelhecimento bem-sucedido, sem justiça social, é só mais uma narrativa elitista. Não há como envelhecer bem num país que naturaliza a exclusão.

É nesse campo que a gerontologia social crítica atua: desnaturalizando o abandono, nomeando as ausências como escolhas políticas, resgatando o papel do Estado e da coletividade na produção de uma velhice possível — para todos, e não apenas para alguns.

Ambiente, redes de apoio e o que propõe a gerontologia social crítica

Ninguém envelhece sozinho.

Ainda que o discurso contemporâneo insista na autonomia como uma virtude absoluta, o envelhecimento é, e sempre será, um processo profundamente relacional. A forma como envelhecemos depende, em grande medida, de onde estamos, com quem estamos, e do que (ou de quem) podemos contar.

O ambiente onde uma pessoa vive — seja ele físico, social ou simbólico — molda diretamente as condições do envelhecimento.

Não é a mesma coisa envelhecer num bairro arborizado e acessível, com centros de convivência, transporte público eficiente e segurança comunitário do que envelhecer numa rua sem calçada, sem posto de saúde próximo, cercado de muros, de medos e de solidão. E não é só sobre espaço. É também sobre laços.

Redes de apoio são determinantes: família, vizinhos, amigos, grupos, profissionais. E, no entanto, em tempos de individualismo crescente, essas redes têm se dissolvido. O que sobra, muitas vezes, são relações fragilizadas ou condicionadas à lógica do cuidado como sacrifício — quase sempre delegado às mulheres.

A gerontologia social crítica reconhece essas fragilidades e, em vez de culpabilizar o indivíduo, propõe uma reconfiguração coletiva. Ela não quer só melhorar a velhice. Quer transformar o modo como a sociedade se organiza em torno da vida.

Essa abordagem rompe com a ideia de que a pessoa idosa precisa se adaptar a um mundo que não foi feito para ela. Pelo contrário: ela defende que o mundo é que precisa se reorganizar para acolher todas as idades, todos os corpos, todas as formas de existir. Porque o envelhecimento só será justo quando for plural, acessível e coletivo.

A gerontologia crítica também nos lembra que envelhecer não é apenas sobreviver ao tempo, mas ter o direito de seguir pertencendo. Pertencer ao território, às decisões, aos afetos, às políticas. Ser ouvido, considerado, respeitado. Ela nos convida a olhar para a velhice como parte de um projeto de sociedade mais inclusiva, menos capacitista, menos excludente. Não quer prometer uma velhice perfeita — porque isso seria ingênuo —, mas quer garantir o mínimo ético de dignidade: cuidado, respeito, direito à escolha e à permanência.

O envelhecimento não pode mais ser tratado como um problema individual a ser resolvido com resiliência. É uma questão coletiva. E, por isso, exige mudança de cultura, de políticas e de práticas profissionais.

 

Na Terça da Serra, acreditamos que envelhecer é um direito — e deve ser vivido com dignidade, cuidado e pertencimento. Nossos residenciais sênior não são apenas espaços físicos, mas ambientes afetivos, pensados para valorizar histórias, respeitar individualidades e fortalecer vínculos. Venha conhecer uma das nossas unidades mais próximas de você, acesse já o site!

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