A premissa básica desse restaurante é diferente de tudo que você já viu ou já ouviu falar: não é você quem escolhe o pedido, porque no fim, por mais que você escolha, pode ser que o seu pedido não chegue até você. Localizado em Tóquio, no Japão, o restaurante tem um pré-requisito peculiar para escolher os seus garçons: todos eles possuem doenças de comprometimento cognitivo, como Alzheimer. Venha conhecer e entender um pouco mais sobre essa iniciativa criada em 2017 que vem encantando o mundo todo!
O que é o Restaurant of Order Mistakes?
O nome já entrega o clima: The Restaurant of Order Mistakes, algo como “O Restaurante dos Pedidos Errados”. Sim, é isso mesmo. Você faz o seu pedido e pode receber outra coisa completamente diferente. E isso não é uma falha do sistema. É a proposta. Tudo foi pensado pra ser assim.
A ideia nasceu no Japão, pelas mãos do jornalista Shiro Oguni. Ele queria encontrar uma forma de fazer o mundo olhar com mais empatia para as pessoas com demência. Não com pena. Não com medo. Com humanidade. Ao invés de esconder os erros, o esquecimento, a confusão, por que não acolher tudo isso com leveza? Foi assim que nasceu esse restaurante pop-up, que apareceu pela primeira vez em Tóquio, em 2017, durante um evento de conscientização sobre Alzheimer.
A dinâmica é simples: você chega, é recebido com carinho, faz seu pedido e aguarda. Mas enquanto espera, já sabe que o que vai chegar pode ser uma surpresa. Pode ser parecido com o que você pediu. Pode ser completamente diferente. E tudo bem. Porque ninguém ali está exigindo perfeição. Todo mundo entrou no jogo sabendo que o erro faz parte. E é justamente isso que torna tudo tão especial.
Mas o restaurante não se resume à brincadeira de receber um prato trocado. Ele tem um propósito mais profundo. Ele mostra, na prática, que as pessoas com demência continuam capazes de participar da vida, de contribuir, de se comunicar, de servir. Elas não estão reduzidas a um diagnóstico. Elas não são o problema. Elas fazem parte da solução. Basta que a gente crie espaços mais humanos, mais pacientes, mais compreensivos.
O restaurante funciona como uma espécie de palco real, onde o esquecimento não é um erro a ser corrigido, mas uma parte da cena. Uma cena onde todos saem tocados de alguma forma. Quem serve e quem é servido. Quem esquece e quem aprende a esperar. Quem erra e quem sorri diante disso.
O que começou como um projeto experimental virou símbolo de inclusão e de mudança de olhar. Um lembrete prático de que dá pra viver – e conviver – mesmo quando as coisas saem do roteiro.
Quem são os garçons?
Os protagonistas desse restaurante não são os chefs nem os pratos. São os garçons. Pessoas reais, com histórias reais, que convivem com algum tipo de demência. Alzheimer, demência frontotemporal, ou outras formas de comprometimento cognitivo. Gente que, em muitos contextos, seria afastada. Esquecida. Isolada. Aqui, elas estão no centro da cena.
Esses garçons não são treinados para decorar pedidos, calcular tempo ou entregar tudo com precisão cirúrgica. Eles estão ali para acolher, para se relacionar, para viver a experiência com o cliente do jeito que conseguem. Com o que têm. Com o que lembram. Com o que sentem. E isso muda tudo.
Trabalhar nesse restaurante é mais do que servir mesas. É ser visto. É ser reconhecido como alguém que ainda pode. Que ainda sabe. Que ainda sente prazer em interagir. E, principalmente, que ainda merece estar presente.
Para muitos deles, esse trabalho traz de volta um sentido que a rotina da doença costuma apagar. Traz risos. Traz pertencimento. Traz o desafio bom de fazer algo diferente. Não é sobre corrigir o esquecimento. É sobre incluir o esquecimento na dança da vida, do jeito que der.
E os clientes sabem disso. Eles não esperam perfeição. Esperam conexão. E recebem de volta algo que nenhum manual de atendimento ensina: cuidado genuíno. Mesmo que venha com um pedido trocado ou um nome esquecido no meio do caminho.
Ali, cada garçom é uma história viva. Uma lição ambulante sobre paciência, sobre adaptação, sobre o valor de estar com o outro, mesmo quando a memória já não é mais a mesma.
Quando o erro vira encontro
A beleza desse restaurante está justamente naquilo que a maioria tenta evitar: o erro. A proposta não é só aceitar que o pedido pode vir errado. É entender que esse erro tem algo a ensinar. Tem algo a revelar. Não é sobre eficiência. É sobre vínculo.
Quando uma pessoa com demência serve um prato diferente do que foi pedido, isso não significa que ela falhou. Significa que algo ali escapou da memória — e tudo bem. O que importa é o que acontece depois. A forma como o cliente reage. O espaço que se cria a partir desse pequeno desvio.
E o que se vê, quase sempre, é sorriso. É leveza. É gente aceitando com graça o que veio. Gente que ri junto. Que agradece. Que troca olhares e palavras gentis. Porque não se trata de exigir. Se trata de estar junto.
Tem um dado que diz muito sobre isso. Em uma das edições do restaurante, mais de 60% dos pedidos vieram errados. Mesmo assim, 99% dos clientes saíram satisfeitos. Noventa e nove por cento. Isso mostra que a experiência vai além da comida. Ela toca num lugar mais profundo. Onde ser bem atendido não significa ser atendido com exatidão, mas com humanidade.
E é curioso perceber como, quando a gente sabe que o erro pode acontecer, a expectativa muda. O ritmo muda. A cobrança diminui. O encontro ganha espaço. A pressa sai de cena. E a troca acontece com mais afeto.
É o tipo de lugar onde, sem perceber, você aprende a esperar. Aprende a lidar com a frustração de um jeito mais gentil. Aprende a rir de si mesmo. E, acima de tudo, aprende a enxergar o outro com mais empatia.
Porque ali, o que vale não é o prato certo. É o olhar. É o gesto. É o tempo compartilhado entre dois seres humanos, cada um do seu jeito, fazendo o melhor que pode.
De Tóquio para o mundo
O que começou como um restaurante pop-up lá em Tóquio acabou se tornando um símbolo mundial de inclusão. A ideia simples, mas poderosa, de transformar o erro em acolhimento atravessou fronteiras e inspirou outras experiências ao redor do mundo.
Um exemplo marcante vem da Bélgica, com o reality show chamado Restaurant Misverstand — que pode ser traduzido como “Restaurante do Mal-entendido”. A proposta é parecida: pessoas com demência trabalhando como atendentes em um restaurante real, servindo clientes reais, enfrentando os desafios da memória e da convivência ao mesmo tempo.
O programa mostra o dia a dia desses trabalhadores com uma delicadeza impressionante. Não romantiza a condição. Mas também não reduz ninguém a ela. Mostra os tropeços, sim. Mas mostra também os momentos de alegria, de superação, de afeto. E talvez por isso tenha feito tanto sucesso, ao ponto de vencer um Emmy Internacional em 2024.
Outros países já começaram a testar modelos parecidos. Alguns em casas de repouso, outros em eventos públicos, todos tentando fazer o mesmo movimento: abrir espaço para que a demência seja vista com mais empatia e menos medo. Mostrar que, mesmo quando a autonomia se desfaz aos poucos, ainda há muito o que viver. Ainda há muito o que compartilhar.
E tudo isso começou com um restaurante. Um lugar que resolveu dizer sim para o erro. Sim para a lentidão. Sim para o esquecimento. E, com isso, abriu caminho para um jeito novo — e mais bonito — de estar com o outro.
E quando o cuidado é feito com afeto?
Falar sobre demência é também falar sobre presença. Sobre criar ambientes onde o esquecimento não seja sinônimo de exclusão, mas de acolhimento. Onde o tempo do outro é respeitado. Onde há paciência, escuta e espaço pra continuar existindo com dignidade.
Projetos como o Restaurant of Order Mistakes mostram o quanto a convivência com a demência pode ser mais leve quando ela acontece num ambiente seguro. Onde ninguém precisa fingir que está tudo bem. Onde a fragilidade não precisa ser escondida. Onde o erro não machuca — ensina.
E é por isso que espaços como a Terça da Serra são tão importantes. Porque ali o cuidado acontece todos os dias, de forma planejada, gentil, atenta. Porque ali, cada pessoa continua sendo vista como única. Mesmo que esqueça. Mesmo que se confunda. Mesmo que precise de ajuda para se lembrar do que já sabia fazer sozinha.
Venha conhecer uma das nossas unidades e se encantar com o jeito Terça da Serra de cuidar e lidar com esse cenário todos os dias de forma leve, humanizada e qualificada! Agende uma visita na unidade mais próxima de você!